Charge em Café com Sociologia
[EcoDebate] Há uma batalha que se trava entre a pressão exógena a favor de seus padrões estéticos e a beleza que cada indivíduo reconhece (ou não) em si. Essa relação de forças não ocorre somente em relação às características de nossos corpos, mas em como se idealiza nosso cinema, nossa música, nosso teatro.
Para evitar considerações breves sobre áreas tão distintas neste espaço pequeno, redijo um texto sobre a nossa dificuldade de ser coerentes com nossa própria beleza, ainda que ela difira do que se chama padrão estético. Numa frase sucinta, poucos estamos satisfeitos com o que somos e com o que temos.
Esse desafio de autoestima deve-se, em grande parte, a sugestões de que nossa massa corporal deve ser tanto, nossa altura outro tanto, nosso cabelo de um jeito e nosso sorriso de outro. O padrão de beleza no Brasil é meticulosamente calculado de acordo com aquele 1 de cada 1000 seres (como indicam fontes várias da Internet) que terá condições de satisfazê-lo. Os outros 999 restarão com suas frustrações, a menos que aprendam a trabalhar com sua psicologia.
Além de cifras como estas, há fatores culturais que pesam sobre a medida de sofrimento ou de realização daqueles que aceitam os padrões de beleza. Isto se deve a que estes mudam ao longo do tempo e em cada país ou grupo étnico. Estas variações ocorrem em qualquer cultura, mas, no Ocidente, posso mencionar momentos em que as mulheres se preocupavam com os contornos da cintura e, em seguida, com seios protuberantes (logo fizeram uso de silicone).
Júlia Moioli, em sua reportagem Quais países têm os padrões de beleza mais estranhos? (Mundo Estranho, Edição 107) compara os padrões de beleza de alguns países. Ela indica que, por exemplo, o padrão do Irã valoriza a exibição de um nariz bonito, o de tribos de Mianmar enobrece pescoços longos, e o da Mauritânia valoriza mulheres obesas como pertencentes à elite.
Como é de se esperar nos países modernos ocidentais, os meios de comunicação (sobretudo em suas telenovelas) têm um papel influente na definição de que aparência e que corpo as pessoas devem ter. É nítido que, no Brasil, o modelo clássico greco-romano de beleza física é bastante presente; ainda assim, este modelo tem sofrido modificações no decorrer do tempo que favoreceram uma aparência alta, magra e loira para homens e mulheres.
Este olhar ocidentalizante sobre um corpo esbelto e descolorido não é fiel à mistureba étnica de que o Brasil é testemunha em suas entranhas. Por isso a televisão fez barulho quando uma mato-grossense de pele morena venceu o concurso Miss Brasil 2013, que é promovido pela Rede Bandeirantes. Houve um alarido porque finalmente uma “brasileira típica” havia sido eleita em disputa de beleza física. Não obstante, continuo acreditando que a mato-grossense seja 1 das 1000 que têm o porte estético autorizado, mas não por ser morena ou alva.
Na opinião do escritor Augusto Cury, autor do livro A ditadura da beleza e a revolução das mulheres (2005), para quem qualquer pessoa tem uma beleza particular e única que não justifica a busca de padrões de beleza exógenos, estranhos e impostos. Não precisamos ser como o ator da novela que malha tantas horas por dia ou como a apresentadora de televisão que ganha seu salário, em parte, porque tem o padrão estético que seu empregador deseja.
Valorizemo-nos naquilo que somos (por fora e por dentro) sem nos intimidar por padrões de beleza que ignoram aquilo que temos de mais precioso.
Não há padrão de beleza certo ou errado, bom ou ruim, melhor ou pior, mas aquele que serve à autoestima e à aceitação de nós mesmos.
Surpreendamo-nos com o resultado de uma simples mudança de atitude neste assunto. Nossas belezas assomarão como as flores na primavera.
* Colaboração de Bruno Peron Loureiro, mestre em Estudos Latino-americanos pela Universidade Nacional Autónoma do México (UNAM), para o EcoDebate, 12/05/2014