Na região metropolitana de São Paulo, agricultores usam espaços públicos e geram renda na venda de hortaliças
O número de hortas em espaços vazios, mesmo numa grande metrópole, é uma prática comum e que gera renda a algumas famílias. “Os preços podem variar de acordo com a região e algumas pessoas chegam a viver exclusivamente desta atividade”, conta a cientista social, Michele Rostichelli. Na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, ela empreendeu um estudo para saber quem são as pessoas que produzem esses alimentos, as características destas famílias e suas origens.
Na pesquisa de mestrado Entre a Terra e o Asfalto: a região metropolitana de São Paulo no contexto da agricultura urbana, Michele entrevistou componentes de 26 famílias que produzem hortaliças na Região Metropolitana de São Paulo, mais especificamente na região do ABC — nas cidades de Santo André, São Bernardo do Campo, Diadema e Mauá —, e no bairro de São Mateus, na zona leste de São Paulo. Boa parte destas pessoas já teve convivência com as práticas agrícolas. “A maioria vem do nordeste do Brasil ou do interior de São Paulo e chegaram por aqui para tentar a vida”, conta a pesquisadora.
Foram mais de dois anos de observações e entrevistas nas áreas de plantações. Estes locais são, principalmente, sob as linhas de eletricidade da Eletropaulo, que a pesquisadora denomina como “linhões”, e terrenos vazios. “Os ‘linhões’ são espaços que abrigam as grandes torres de eletricidade onde, por segurança, não se permite a construção de moradias e o plantio de árvores de grande porte”, explica. É justamente nesses terrenos que as pessoas cultivam suas hortaliças, principalmente alface e coentro. “Mas a produção se estende para outras culturas, como agrião, escarola, e até banana”, conta Michele. Segundo ela, a ocorrência de hortas nas cidades estudadas teve início nas décadas de 1970 e 1980, período em que se podiam encontrar chácaras e sítios nestes locais .
Preços de mercado
As hortaliças são comercializadas nos bairros próximos às plantações e os preços, segundo Michele, podem variar de acordo com a região. “Numa das hortas próximas a um bairro de classe média em Santo André, por exemplo, a alface chega a custar R$ 2,00. Mas em outro local onde a maioria dos moradores é de baixa renda, pode-se comprar por R$ 1,00. Dificilmente os preços praticados ficam acima dos valores comercializados nos grandes supermercados ou feiras livres”.
As hortaliças são comercializadas nos bairros próximos às plantações e os preços, segundo Michele, podem variar de acordo com a região. “Numa das hortas próximas a um bairro de classe média em Santo André, por exemplo, a alface chega a custar R$ 2,00. Mas em outro local onde a maioria dos moradores é de baixa renda, pode-se comprar por R$ 1,00. Dificilmente os preços praticados ficam acima dos valores comercializados nos grandes supermercados ou feiras livres”.
Outra característica das hortaliças comercializadas é o não uso de agrotóxicos ou fertilizantes químicos. “Entre os entrevistados, quase todos afirmam que não se utilizam de qualquer elemento químico. Usam adubos naturais, como torta de mamona, estercos, cinzas de madeira e, por vezes, calcário para controle do ph da terra”, descreve Michele. Mesmo assim, as hortaliças não podem ser consideradas orgânicas porque as sementes adquiridas são “tratadas”. Michele conta que são compradas, principalmente, nas cidades de Suzano e Mogi das Cruzes, região da grande São Paulo, denominada “cinturão verde”.
Michele acredita que a prática da agricultura em espaços vazios das grandes cidades deve permanecer e até crescer, visto que há incentivos para criação de hortas comunitárias pela vizinhança organizada, ONGs e até de administrações municipais. “Vale lembrar que nas áreas sob os ‘linhões’ a concessão é dada pelas prefeituras”, ressalta. Em quase todas as hortas analisadas no estudo, o espaços de plantios têm, em média, 200 metros quadrados (m2) e os agricultores não dispõem de maquinários agrícolas, o trabalho é manual, “Eles usam ferramentas tradicionais, como enxadas, pás, etc.” E de acordo com a cientista social, ainda existem muitos espaços nas cidades que podem ser utilizados para a atividade. A pesquisa de Michele teve a orientação da professora Valéria de Marcos e foi apresentada no Departamento de Geografia Humana da FFLCH.
Fotos: Divulgação
Por Antonio Carlos Quinto, da Agência USP de Notícias.
EcoDebate, 11/08/2014