A agenda da Reforma Agrária encontra-se estagnada e vem regredindo no governo Dilma Rousseff. Ao longo dos últimos 20 anos, o governo Dilma é o que menos desapropriou imóveis rurais para fazer reforma agrária.
Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), “no ano de 2012, o Brasil assistiu a Reforma Agrária alcançar os seus piores indicadores em décadas. Enquanto do outro lado, o Agronegócio se consolidou como o modelo preferencial do Governo Dilma para o campo, priorizado por diversas políticas públicas, inclusive com financiamentos oficiais de elevadas proporções”. De acordo com a CPT, “se continuar no mesmo ritmo de 2012, o Brasil precisará de mais 50 anos só para assentar a demanda atual de famílias sem terra acampadas”.
Ainda segundo a CPT, “outra decepção foi com relação às áreas de assentamentos já existentes, declaradas como prioridade pelo governo Dilma”. A CPT diz que “faltou política de Estado (crédito, habitação, infraestrutura, parcelamento, etc) e para a maioria dos assentamentos não foram liberados recursos para os Planos de Desenvolvimento dos Assentamentos (PDAs) – ferramenta principal para obtenção de créditos de investimentos e produção”.
Por outro lado, diz a organização, “a pauta da Reforma Agrária do governo caminhou em um ritmo inversamente proporcional à velocidade e intensidade do agronegócio. A permissividade irrestrita concedida à bancada ruralista dominou internamente o governo e fez paralisar não só o Incra, mas tudo aquilo que pudesse interferir em seus interesses”.
Segundo a CPT, “lamentavelmente, a opção do Governo pelo agronegócio está consolidada e é demonstrada tanto através do discurso político da maioria dos ministérios como pela forte liberação de recursos para as grandes empresas do setor”. O agronegócio, afirma, “se instala onde deseja e o Estado brasileiro oferece todas as condições para isso, mesmo em áreas destinadas para a conservação da biodiversidade, terras indígenas ou de populações tradicionais diversas, ainda que o discurso oficial algumas vezes afirme o contrário”.
A hegemonia do agronegócio é segundo João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST, o grande entrave para se alterar a estrutura agrária brasileira. Segundo ele, “85% de todas as melhores terras do Brasil são utilizadas apenas para soja/ milho, pasto e cana-de-açúcar”. Stedile destaca que “apenas 10% dos proprietários rurais, os fazendeiros que possuem áreas acima de 500 hectares, controlam 85% de todo o valor da produção agropecuária, destinando-a, sem nenhum valor agregado, para a exportação”.
“O agronegócio reprimarizou a economia brasileira”, afirma João Pedro para quem “somos produtores de matérias-primas, vendidas e apropriadas por apenas 50 empresas transnacionais que controlam os preços, a taxa de lucro e o mercado mundial”. Surpreendentemente em 2012, o Brasil precisou comprar feijão preto da China, comenta Roberto Smeraldi.
Na opinião de Alexandre Conceição, também da coordenação nacional do MST, “o governo Dilma é refém dessa aliança com o agronegócio, que é o latifúndio modernizado, que se aliou com as empresas transnacionais. O governo está iludido pela proteção que a grande mídia dá a essa aliança e com os saldos na balança comercial”.
Esse modelo, diz Stedile “é insustentável para o meio ambiente, pois pratica a monocultura e destrói toda a biodiversidade existente na natureza, usando agrotóxicos de forma irresponsável. O resultado é que o Brasil responde por apenas 5% da produção agrícola mundial, mas consome 20% de todos os venenos do mundo”, afirma.
O problema é que o governo não demonstra disposição para mudar esse quadro. “Infelizmente, não há motivação no governo para tratar seriamente esses temas. Por um lado, estão cegos pelo sucesso burro das exportações do agronegócio, que não tem nada a ver com projeto de país, e, por outro lado, há um contingente de técnicos bajuladores que cercam os ministros, sem experiência da vida real, que apenas analisam sob o viés eleitoral ou se é caro ou barato”, diz João Pedro Stedile.
Segundo ele, “ultimamente, inventaram até que seria muito caro assentar famílias, que é necessário primeiro resolver os problemas dos que já têm terra, e os sem-terra que esperem. Esperar o quê? O Bolsa Família, o trabalho doméstico, migrar para São Paulo”? O governo está prometendo que em 2013 irá acelerar as desapropriações.
A regressividade da agenda social no mundo rural acompanha também as populações tradicionais. A falta de prioridade não atingiu apenas os sem-terras, mas também as comunidades quilombolas, indígenas, ribeirinhas, pescadores tradicionais, bem como os agricultores e agricultoras que sofrem os efeitos de uma seca de dimensões insuportáveis, principalmente no Nordeste.
As esperanças de retomada da agenda dos povos do campo e tradicionais encontram-se no movimento social. Um fato alentador foi a realização em agosto de 2012, do Encontro Unitário dos Trabalhadores, Trabalhadoras e povos do campo, das águas e das florestas, que reuniu cerca de 7 mil pessoas em Brasília. A perspectiva que se apresenta para 2013 é de que os povos do campo coloquem em marcha as lutas unificadas e assumam para si a responsabilidade da Reforma Agrária e da defesa dos territórios das comunidades tradicionais ameaçadas pelo capital.
A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia.
(Ecodebate, 22/01/2013) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]