Brasília, 08/07/2013 – O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, participa do lançamento de programa que vai levar médicos para atender no interior e em regiões metropolitanas do país. Foto de Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
[EcoDebate] Passar de 6 para 8 anos o curso de Medicina, com 2 anos atendendo no SUS como requisito para receber o diploma . Imaginem se a moda pega: mais 2 anos de faculdade de Direito para que atendam na Defensoria Pública ou mais 2 anos de Magistério trabalhando em escolas públicas, tudo sem receber o diploma – o que torna o trabalho desses profissionais mais barato para o governo, enquanto as faculdades particulares faturam mais 2 anos de mensalidades. Além disso, a contratação de médicos estrangeiros é a outra providência oficial, como resposta para a crise da saúde, quer dizer: a culpa é dos médicos.
Há pesquisas de opinião aprovando essas medidas do governo, talvez imaginando a categoria como abastada – sem saber que o valor pago pelo SUS pela consulta médica rende menos que um cachorro quente vendido em frente ao hospital. Alguns locais oferecem contratos melhores, mas ter de escolher qual paciente vai poder ser atendido numa emergência, ou entubado numa UTI, é um drama que nada paga: ver pacientes morrendo, impotente, e ser processado depois. Os médicos estão mal distribuídos, concentrados na região metropolitana onde há equipamentos: no interior, prevalece a “ambulancioterapia” para a capital, ao invés de equipar os hospitais municipais. Faltam leitos em UTIs, faltam vagas nos hospitais, mas o governo não quis destinar 10% das verbas para essa área na Emenda 29, que definiu os investimentos federais em saúde. Assim como já ocorrera com a CPMF, que anos atrás era para ser aplicada em saúde mas caiu no caixa único da União até ser extinta.
Há problemas crônicos no país e não só a nível federal: faltam políticas públicas nos estados e municípios, até 70 % dos pacientes do SUS são afetados por falta de saneamento (água potável, esgotos sanitários, águas pluviais contaminadas e disposição final inadequada de resíduos sólidos), pelo déficit habitacional, com 4 milhões de pessoas vivendo em favelas em São Paulo e mais de 200 favelas em Porto Alegre – assim, não conseguimos controlar nem a proliferação da dengue.
A população necessita de mais médicos no SUS, mas o melhor modo de ter profissionais envolvidos com sua missão não é de modo forçado. A colaboração dos profissionais poderia ser voluntária, fruto do diálogo do governo com a categoria, que vem se envolvendo cada vez mais nas questões sociais – o Simers e o Cremers, por exemplo, são entidades atuantes na fiscalização de hospitais e das condições necessárias ao trabalho médico. Uma campanha poderia ser feita ou até mesmo, num espírito análogo ao serviço militar obrigatório, os médicos poderiam ser “convocados” a atender no SUS por 2 anos, sem a perversa condição de “não graduados” nesses 2 anos.
O diploma não ser entregue até completar 8 anos desvaloriza os profissionais. Com a Educação não deu certo: achatar os salários dos professores, décadas após décadas, só agravou a situação da Educação no país. Os salários aviltados da maioria dos policiais também não gerou uma “segurança cidadã” no Brasil, o que contrasta por exemplo com o bom trabalho da Polícia Federal, uma carreira funcional mais valorizada. É fácil ser “corajoso” enfrentando categorias profissionais, ao invés de oligopólios econômicos, que tem apoio do BNDES. Não gastar em saúde, não pagar professores, ter déficit de policiais e dizer que a valorização das categorias é “corporativista”. Culpar médicos, professores, policiais, não resolve os problemas da saúde, educação e segurança, em nenhum lugar.
Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.
EcoDebate, 15/07/2013