Os medicamentos fitoterápicos são alopáticos cujos princípios ativos podem ser as drogas vegetais (plantas secas e rasuradas) ou os derivados vegetais (extratos, óleos essenciais, entre outros) aos quais podem ser adicionados excipientes farmacêuticos (como flavorizantes, conservantes e edulcorantes)
“Os produtos terapêuticos derivados de plantas medicinais e oficializados para uso no Brasil são remédios, mas ainda não são medicamentos e não devem ser regulamentados como tal. Eles serão disponibilizados ao consumidor sem a garantia da sua eficácia e da sua segurança, perpetuando a ausência de controle sanitário da área e contrariando os princípios básicos de toda política de medicamentos: o acesso seguro, a qualidade e o uso racional”. O alerta é da aluna do doutorado em saúde pública Sabrina Schaaf Teixeira Costa Pereira, que defendeu sua tese na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) em 22 de julho. Segundo ela, esses produtos não são avaliados cientificamente de forma adequada por meio de pesquisas pré-clínicas e clínicas, existindo um processo de regulamentação facilitador da sua entrada no mercado e, consequentemente, da sua incorporação no sistema de saúde.
Sabrina fez uma análise crítica do embasamento técnico-científico para registro de produtos terapêuticos industrializados derivados de plantas medicinais, incluindo os medicamentos fitoterápicos e as drogas vegetais industrializados com uso oficializado pelo Ministério da Saúde. A ênfase foi para os requisitos relacionados à comprovação científica da eficácia e da segurança que constam da regulamentação sanitária; a abrangência e a pertinência dos estudos não clínicos e clínicos referidos em monografias de plantas medicinais (coleção de monografias de plantas medicinais da Organização Mundial da Saúde, volumes 1, 2, 3 e 4), monografias da Comissão E da Alemanha e a expansão das monografias da comissão que dão suporte à regulamentação sanitária na área (pertencem à lista de referências bibliográficas utilizadas como umas das opções para comprovação da eficácia e segurança para fins de registro); e a qualidade do relato de metodologia dos ensaios clínicos publicados realizados com esses produtos.
Seu trabalho definiu uma diferença entre as nomenclaturas. Os medicamentos fitoterápicos são alopáticos cujos princípios ativos podem ser as drogas vegetais (plantas secas e rasuradas) ou os derivados vegetais (extratos, óleos essenciais, entre outros) aos quais podem ser adicionados excipientes farmacêuticos (como flavorizantes, conservantes e edulcorantes). Essa formulação é, então, incorporada a uma forma farmacêutica (cápsula, comprimidos, entre outros) formando o produto final, que é o medicamento fitoterápico. A droga vegetal industrializada é um produto novo criado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), desde 2010, para tentar estabelecer certo controle de qualidade aos produtos vendidos nos comércios ilegais de plantas medicinais. Ela é a planta medicinal, ou suas partes, rasuradas, trituradas ou pulverizadas, estabilizadas ou não, e apresentadas na forma final ao consumidor para serem utilizadas na preparação caseira de infusões, decocções e macerações, com indicações terapêuticas padronizadas pela norma RDC 10/10. Já as plantas medicinais são todas as espécies vegetais, cultivadas ou não, utilizadas com propósitos terapêuticos (RDC 14/10).
Existem pelo menos 152 espécies de plantas medicinais diferentes oficializadas pelo Ministério da Saúde para serem utilizadas como medicamentos fitoterápicos industrializados ou como drogas vegetais industrializadas ou, ainda, com potencial de uso terapêutico, como é o caso das espécies pertencentes à Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse ao SUS (Renisus http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/visualizar_texto.cfm?idtxt=30780 ), que é uma lista de espécies com potencial de uso na forma de medicamentos fitoterápicos para serem utilizados no Sistema Único de Saúde (SUS).
De acordo com a aluna, a norma vigente que regulamenta o registro de medicamentos fitoterápicos industrializados, RDC 14/10, permite quatro opções para comprovação da eficácia e da segurança para fins de registro: obtenção de pontuação baseada na presença de testes toxicológicos e farmacológicos nos documentos da lista de referências bibliográficas (Instrução Normativa n° 5 de 2010); levantamento etnofarmacológico de utilização que comprove o uso tradicional por um período de no mínimo 20 anos; presença na lista de medicamentos fitoterápicos de registro simplificado (IN n° 5 de 2008); e apresentação de estudos farmacológicos e toxicológicos pré-clínicos e ensaios clínicos (RE 90/04).
“Como as drogas vegetais industrializadas não precisam ser registradas, o fabricante deve comunicar à agência reguladora (Anvisa) sobre a produção e comercialização do produto mediante o processo de notificação simplificada, via sítio eletrônico da agência”, informou ela. São 66 espécies de plantas medicinais que podem ser produzidas e comercializadas na forma de drogas vegetais industrializadas com indicações terapêuticas padronizadas. A pesquisa concluiu que a complexidade na avaliação científica dos fitoterápicos e a consequente baixa qualidade da evidência clínica na área, associadas à “necessidade” de manutenção desses produtos no mercado, dão abertura a mecanismos flexibilizadores no processo de regulamentação sanitária pelo qual as plantas medicinais e os medicamentos fitoterápicos oficializados para uso no país obtêm o seu registro e são incorporados ao SUS sem a adequada avaliação da sua utilidade terapêutica.
Sabrina Schaaf Teixeira Costa Pereira é graduada em biomedicina pela Universidade Federal de São Paulo (2003) e mestre em toxicologia pela Universidade de São Paulo (2009), trabalhando atualmente com produtos naturais.
Informe Ensp / Agência Fiocruz de Notícias, publicado pelo EcoDebate, 26/07/2013