Cores amarelo e marrom apresentam concentrações relativamente altas de clorofila, em agosto de 2012, depois do sulfato de ferro foi despejado no Oceano Pacífico, como parte de um controverso projeto de geoengenharia. Foto: Giovanni/Goddard Earth Sciences Data and Information Services Center/NASA – The Guardian
Geoengenharia à revelia – Um empresário americano decidiu realizar por conta própria um grande experimento de geoengenharia, desobedecendo ao mesmo tempo duas resoluções da Organização das Nações Unidas (ONU) e uma moratória global neste tipo de experiência. Imagens de satélite indicam que Russ George, ex-presidente da empresa de geoengenharia Planktos Inc, lançou cerca de cem toneladas de sulfato de ferro no mar da Costa Oeste do Canadá, provocando uma explosão artificial de plâncton numa área de 10 mil quilômetros quadrados de oceano. A ideia é de que este plâncton absorva dióxido de carbono da atmosfera e depois afunde para o leito oceânico, uma técnica conhecida como “fertilização oceânica” que ele espera transformar em uma lucrativa fonte de créditos de carbono. Matéria em O Globo, socializada pelo Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4608.
O problema é que os cientistas ainda têm dúvidas se esta técnica permitirá a captura de carbono a longo prazo. Além disso, há o temor de que a fertilização provoque uma reprodução descontrolada de algas tóxicas, trazendo prejuízos para o ecossistema marinho e provocando o surgimento de zonas mortas, onde os níveis de acidez e oxigenação da água impedem o desenvolvimento de qualquer forma de vida.
“É difícil, se não impossível, detectar e descrever os efeitos que isso [a fertilização oceânica] pode provocar daqui a meses ou anos”, disse John Cullen, oceanógrafo da Universidade Dalhousie, no Canadá, ao jornal britânico “Guardian”, que publicou a denúncia feita pela ONG ETC Group. “Alguns destes possíveis efeitos, como a redução dos níveis de oxigênio em águas profundas e alterações em cadeias alimentares distantes, são suficientes para descartarmos a manipulação dos oceanos. A História está cheia de exemplos de manipulações ecológicas que saíram pela culatra.”
Ainda de acordo com o “Guardian”, George teria afirmado que sua equipe de cientistas está acompanhando o experimento com ajuda de equipamentos emprestados pela Nasa. Segundo o empresário, a experiência “é o mais substancial projeto de restauração dos oceanos na História” e que os dados coletados até agora afastam os principais temores relativos à fertilização oceânica. “As notícias são boas em todos os sentidos para o planeta”, defendeu.
O lançamento do sulfato de ferro teria sido feito por um barco pesqueiro numa faixa de mar a 200 milhas náuticas a Oeste das ilhas de Haida Gwaii, um dos mais diversos ecossistemas da Terra e onde George convenceu a população indígena a criar uma empresa dedicada à recuperação da pesca de salmões, à qual aportou recursos da ordem de US$ 1 milhão. O líder da tribo, Guujaaw, disse ao jornal britânico que foi informado de que o lançamento iria beneficiar o oceano, fundamental para a sobrevivência e cultura dos índios.
“O povo da tribo votou para apoiar o que foi dito que era um “projeto de melhoria da pesca de salmão” e não teria concordado se soubesse que ele poderia ter efeitos negativos ou que violava convenções internacionais”, acrescentou Guujaaw.
Segundo especialistas em direito internacional, o projeto de George contraria a Convenção da ONU sobre Biodiversidade e outra resolução da organização sobre o lançamento de dejetos no mar. Ainda está claro que tipo de punição o empresário poderia sofrer. Tampouco foi informado se o governo do Canadá tinha conhecimento da experiência.
“O lançamento de partículas de ferro no oceano não deve ser feito a não ser que seja avaliado e esteja associado a uma investigação científica legítima. Este projeto não parece nem ter o disfarce de uma pesquisa científica legítima”, disse ao “Guardian” Kristina M. Gjerde, consultora da IUCN.
EcoDebate, 23/10/2012