No caminho para a universalização dos serviços de saneamento básico, o Brasil ainda está longe do ideal, especialmente no tratamento de esgoto, que enfrenta problemas como a rejeição da população e a incapacidade técnica das prefeituras, além do déficit gerado por anos de investimentos tímidos ou inexistentes desde o encerramento do Plano Nacional de Saneamento (Planasa) na década de 1980. A análise é do coordenador geral de engenharia e arquitetura da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Ricardo Arantes.
“A distribuição do esgotamento sanitário no Brasil é bastante irregular. São Paulo tem os maiores índices em coleta e tratamento, mas, na grande maioria dos estados, a coleta está em 40% dos municípios, e dos 40% coletados, 50% são lançados in natura no meio ambiente”, disse Arantes.
Segundo ele, a falta de investimento nas décadas de 80 e 90, com o fim do Planasa, afetou principalmente os serviços de esgotamento sanitário, mais caros e aparentemente menos urgentes. Além de o hiato ter interrompido projetos em andamento, ele teria também causado a inoperância de alguns que já tinham sido executados.
Apesar de ser um serviço básico para a população, o esgotamento sanitário enfrenta ainda a resistência das comunidades, principalmente em localidades menores do país. Como o tratamento dos rejeitos gera um custo, que é repassado por meio de novas tarifas, a população nem sempre apoia a chegada do serviço, e os políticos têm pouco interesse em arriscar sua popularidade por esse motivo. “Isso é um dos pontos que faz o investimento ficar baixo. O custo de implantação do esgotamento é bem mais elevado que o sistema de abastecimento de água”.
Outra questão que dificulta o avanço do tratamento de esgoto no país é a falta de qualificação de profissionais e gestores de cidades pequenas, que, em alguns casos, não conseguem elaborar projetos que sejam aceitos para o repasse de recursos das esferas superiores: “No PAC [Programa de Aceleração do Crescimento], vimos que muitos projetos tinham uma qualidade muito baixa, e, por isso, no PAC 2, pedimos verba para a elaboração de projetos.”
Para tentar contornar o problema, a Funasa já elaborou mais de mil projetos para prefeituras do país, e já tem contratos para fazer mais 2,6 mil. “Dessa forma podemos aumentar a qualidade e até a agilidade dos projetos.”
Além de manter limpos e livres de contaminação os ambientes dos municípios, o tratamento de esgoto também contribui para a preservação de aquíferos e lençóis freáticos, que podem ser contaminados até mesmo por fossas sépticas mal operadas. Mesmo assim, Ricardo Arantes pondera que, no Brasil, só está implementado o tratamento secundário de esgoto, que elimina a matéria orgânica, mas deixa passar os micro-organismos, que também podem gerar contaminação subterrânea.