Manifestantes contra o aumento das passagens de ônibus em Porto Alegre terminaram protesto em frente à sede da Prefeitura. Crédito: Mauro Schaefer / Blogue Porto Imagem
[Ecodebate] Abril começou inspirador, com milhares de jovens nas ruas de Porto Alegre para lutar contra o aumento das passagens de ônibus. Falam dos “caras pintadas” que foram às ruas pelo impeachment de Collor, mas na época a mídia mostrava aquelas imagens e elas viraram um modismo. Agora, ao contrário, a “grande mídia” gaúcha evitou repercutir as ações dos jovens: as mobilizações não ganharam muito espaço nos noticiários e as matérias geralmente foram pautadas pela defesa das razões do prefeito e das empresas, batendo na tecla de “excesso de isenções que encarece as passagens” e enfatizando “excessos” que alguns manifestantes cometiam.
Mesmo que a versão oficial fosse um argumento válido, o assunto merecia muito mais espaço e debates pela sua importância. As coberturas destacavam apenas se os eventos eram com ou sem “incidentes”, como se o descontrole de alguns invalidasse todo o movimento e suas causas, ou seja, uma versão “governista” dos acontecimentos. A liminar da Justiça que suspendeu o aumento da passagens, voltando o preço de R$ 3,05 para 2,85, está representando nesse momento uma vitória espetacular dos jovens sobre os interesses das empresas, do prefeito e inclusive das simpatias da grande imprensa, alvo de cartazes, faixas e refrões dos protestos. Uma frase forte de Eduardo Galeano demonstra a revolta dos participantes com a cobertura da imprensa sobre os movimentos sociais: “mijam em nós e os jornais dizem ‘chove’…”.
Fazia sentido que Porto Alegre cobrasse R$ 3,05 por passagem, um preço mais caro até do que São Paulo, que cobra R$ 3,00? A auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCU) já mostrava os indícios de abusividade no aumento das passagens, que fundamentaram a decisão, exemplar, do juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública. Situações abusivas como essa não são “privilégio” de Porto Alegre, houve aumentos nas passagens logo após as eleições em vários municípios, em Cachoeirinha por exemplo os jovens também foram às ruas para protestar pelo mesmo motivo. A vitória desse momento em Porto Alegre é um estímulo para que os jovens das outras cidades não desistam de suas lutas.
O que a capital gaúcha viveu de diferente foi a amplitude desse movimento, algo promissor, para quem acredita que só o controle popular sobre a administração pública é capaz de levar a avanços civilizatórios. Democracia não pode se resumir ao momento do voto, tem de estar presente no dia a dia, na fiscalização dos atos dos nossos governantes, sejam de que local e de que partido forem e independentemente do percentual de votos com que forem eleitos, pois eleição não é uma “carta branca” para se fazer o que quiser após o pleito.
Nas últimas décadas, eu só tinha visto tantos jovens nas ruas em dias de Gre-Nal ou de grandes shows. Quando alguém me diz que “nada muda” na política, eu lembro que se um dirigente da dupla Gre-Nal não vai bem nas suas funções, ele sofre tantas pressões e ameaças nas ruas, ou pelo twitter e facebook, que acaba se demitindo, pela força da reação popular. No dia em que as questões sociais, econômicas e políticas despertarem a mesma indignação que o futebol, com certeza as coisas vão mudar. Gestores públicos terão de ser mais públicos e menos “gestores” de bastidores, se o povo fiscalizar os seus atos e tomar iniciativas.
Nada mais promissor do que os jovens nas ruas, pois é a geração deles que está “herdando” os descaminhos de agora, para construir melhores caminhos para o amanhã.
Montserrat Martins, Colunista do Portal Ecodebate, é Psiquiatra.
EcoDebate, 09/04/2013