Esgoto em natura despejado no rio São Francisco. Foto de arquivo
[EcoDebate] Estou no sertão. Aqui a Bahia encontra Sergipe que encontra Alagoas e Pernambuco. Neste epicentro do semiárido nordestino encontrei por acaso uma cena que nem choca mais; lançamento de esgoto in natura em rio (até mesmo no famoso São Francisco).
Será ainda em um futuro muito distante quando aproveitaremos a água e os nutrientes de nosso esgoto para fins mais nobres que poluir rios ? Talvez não.
Estes nutrientes e água que existem nas águas servidas, junto com o gás carbônico do ar, infelizmente abundante e a luz do sol são os ingredientes necessários para produzir toda sorte de carboidratos que as plantas produzem, como açucares e lipídeos. Escolhendo o vegetal correto podemos produzir biodiesel, e se for um vegetal bem pequeno e simples, a eficiência neste processo será até centenas de vezes mais eficiente que, por exemplo, a soja.
A idéia não é um sonho distante. A cidade de Minneapolis já está com um projeto piloto de centrifugar o esgoto, produzindo um rico concentrado onde as algas fazem a festa. Posteriormente, o biodiesel é extraído das algas. De um lado sobra um concentrado de algas rico em nitrogênio e outros nutrientes para o solo e do outro o biodiesel. Boa parte da água que compõe o esgoto sai limpa já na centrifugação.
Em Recife, uma usina de álcool associada a um grupo austríaco está também usando algas para produção de álcool, estimuladas pelo gás carbônico que antes era lançado na atmosfera e que depois de captar a energia do sol, se transformará em álcool. Esta unidade não irá utilizar esgoto.
O megainvestidor Vinod Khosla, ex CEO da Sun Microsystems diz que o custo disto tudo ainda está muito alto para tornar-se realidade, ao redor de 20 dólares por galão. Mas esta ainda é uma tecnologia bebê. Khosla já acertou muito, mas também já errou muito. Não há como saber, por exemplo, o que escondem as 300.000 espécies de algas que existem por aí, muito menos o que poderão fazer quando se inserirem nelas gens de outras espécies. Também há oportunidades na emissão de Co2 industrial, que é matéria prima para as algas. Serão necessários também estudos abrangentes de viabilidade econômica, que incluam todos outros benefícios além biocombustível.
Megainvestidores e gigantes usinas de álcool à parte, quando neste fim de semana eu voltar para minha aldeia (de onde vejo o mundo, como Fernando Pessoa), seguirei usando o esgoto tratado para irrigar as árvores frutíferas e transformar esgoto em laranja-lima, mexericas e limões. Ainda sem algas, mas também sem muitos problemas.
Efraim Rodrigues, Ph.D. (efraim@efraim.com.br), Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor pela Universidade de Harvard, Professor Associado de Recursos Naturais da Universidade Estadual de Londrina, consultor do programa FODEPAL da FAO-ONU, autor dos livros Biologia da Conservação e Histórias Impublicáveis sobre trabalhos acadêmicos e seus autores. Também ajuda escolas do Vale do Paraíba-SP, Brasília-DF, Curitiba e Londrina-PR a transformar lixo de cozinha em adubo orgânico e a coletar água da chuva. É professor visitante da UFPR, PUC-PR, UNEB – Paulo Afonso e Duke – EUA. http://ambienteporinteiro-efraim.blogspot.com/
EcoDebate, 30/07/2012