[Jornal da Ciência] O Brasil é mesmo um país muito interessante! Quando o ex-vice presidente José de Alencar estava no exercício de suas funções, era considerado um herói por parte da mídia, dos empresários e dos analistas financeiros justamente porque defendia a queda dos extorsivos juros cobrados pela banca brasileira. Pois não é que quando a presidente Dilma resolveu adotar uma política que ia ao encontro daquilo que defendia o já falecido José de Alencar, estes mesmo sujeitos começaram a fazer uma série de ponderações contrárias que, no limite, acabavam por defender a continuidade da política anterior?
O mesmo parece ocorrer hoje com a questão da educação de qualidade no Brasil. Como já se disse, desta dependeria, segundo os empresários, a mão de obra qualificada para fazer frente ao crescimento econômico; já segundo os cientistas, sem melhorar a educação básica não será possível suportar a crescente demanda por produção científica e tecnológica; sem melhorar a educação, afirmam as autoridades do Estado, não será possível retirar o País da posição vergonhosa que ocupa nos rankings internacionais da educação; mas, também, sem melhor educação, dizem os ativistas sociais, não será possível fazer do Brasil um país de instituições modernas e mais democrático. Isto para listar apenas quatro dos principais argumentos mobilizados no momento.
No entanto, tão logo a Comissão Especial da Câmara aprovou a meta número 20 do Plano Nacional de Educação que estabelece que o País, no decorrer da década, caminhará para empregar 10% de seu PIB em educação, houve um conjunto de reações contrárias a isto. Os argumentos são os mais diversos. Há aqueles que defendem que não precisamos de mais recursos, pois basta gerenciar melhor os recursos hoje disponíveis, da ordem de 5% do PIB. Corroborando este argumento, outros afirmam que o Brasil já aplica em educação a média que outros países que mantêm uma escola de melhor qualidade do que a nossa. Há, ainda, outros que defendem que aplicar 10% em educação vai diminuir a capacidade do Estado brasileiro em investir em outras áreas, como saúde, segurança, transportes.
O que fica parecendo é que, no fundo, todos querem uma educação básica de qualidade, desde que isto não implique em alterações muito profundas nas prioridades do investimento público. Ou seja, desde que possamos fazer uma escola de qualidade com poucos recursos. O resultado disso, todos sabemos, é uma escola pobre para pobres.
A não ser que achem que os atuais salários pagos aos professores pelas redes estaduais ou municipais, com a falta de bibliotecas em boa parte das escolas brasileiras, com as precárias condições dos programas de educação de jovens e adultos ou, mesmo, com uma das piores posições de oferta pública de vagas no ensino superior do mundo, os defensores da tese de que não precisamos de mais dinheiro para a educação deveriam, então, mostrar aos prefeitos e governadores brasileiros de onde eles deveriam retirar recursos para tais finalidades. E, de quebra, mostrariam que o Ipea e boa parte dos pesquisadores e ativistas sociais em educação precisam fazer uma “reciclagem” sobre o tema do financiamento da educação, já que estes defendem justamente o contrário.
Vejamos, por outro lado, o caso da comparação com outros países. A França, por exemplo, país com uma economia do tamanho da nossa, aplica quase que o mesmo percentual que o Brasil em educação, algo como 5,7% do PIB. No entanto, como a população em idade escolar da França é muito menor do que a nossa, resulta que o valor per capta aplicado em educação por aquele país é chega a quase 8 mil dólares, enquanto no Brasil ele mal alcança os 1.300 dólares. E olhem que a França não apresenta o nosso passivo educacional – 14 milhões de analfabetos, baixíssima cobertura na educação infantil e baixíssima oferta de vagas públicas no ensino superior, por exemplo – e é, ao mesmo tempo, um país muito menos desigual e com uma cultura política muito mais democrática do que a nossa.
Talvez seja por isso que lá, hoje, eles podem aplicar “apenas” 5,7% do PIB em Educação. Ou, de outro lado, talvez sejam a nossa atávica cultura política antidemocrática e nosso apego à manutenção das desigualdades que façam com que continuemos defendendo uma escola pobre para os filhos dos outros enquanto os nossos filhos e netos estudam em caríssimas escolas particulares. Ou não?
Luciano Mendes de Faria Filho é professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do Projeto Pensar a Educação Pensar o Brasil – 1822-2022. Artigo enviado ao JCEmail pelo autor.
Luciano Mendes de Faria Filho é professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do Projeto Pensar a Educação Pensar o Brasil – 1822-2022. Artigo enviado ao JCEmail pelo autor.
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EcoDebate, 09/07/2012