Enquanto o Brasil não reduzir as desigualdades econômicas e sociais de sua população não conseguirá superar os problemas causados pelas doenças tropicais. A afirmação é do farmacêutico bioquímico Sinval Pinto Brandão Filho, do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães (CPqAM), unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Recife.
Ele ministrou, no dia 23 pela manhã, a conferência ‘Medicina tropical no século XXI’, durante a 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que está sendo realizada durante esta semana, em São Luís, no Maranhão.
De acordo com Brandão Filho, o mundo vive hoje uma transição epidemiológica de muitas doenças tropicais, que estão deixando as áreas rurais e se urbanizando. É o caso da malária, da leishmaniose visceral e tegumentar, da doença de Chagas e da febre amarela, por exemplo, que já chegaram à periferia e até mesmo ao centro de grandes cidades brasileiras. Ali, principalmente nas favelas, elas encontram terreno fértil para se expandirem. “A fragilidade das habitações, a falta de serviços urbanos [assistência à saúde, segurança, política habitacional], a poluição e a ausência de saneamento básico levam ao aumento da incidência de doenças infecciosas e parasitárias”, disse. “Elas são decorrentes da realidade social e não só do clima tropical.”
Além dessas doenças de origem rural, há aquelas que sempre foram comuns nas cidades tropicais, mas também tem sua incidência aumentada por causa da precariedade das condições sociais. É o caso das doenças de transmissão respiratória, como a tuberculose e a influenza (gripe); as sexualmente transmissíveis, com destaque para a Aids; e as de contaminação oral, nas quais se incluem a diarreia, a cólera e a leptospirose. “Há ainda as doenças tropicais urbanas não infecciosas”, acrescentou Brandão. “Entre elas está a novíssima epidemia de lesões e mortes por acidentes de motocicleta. Existem ainda os problemas psicológicos causados pelo medo da violência e do tráfico de drogas; e os males causados pela poluição e pelas catástrofes, como deslizamentos e inundações.”
Diante desse quadro, Brandão Filho disse que a missão da nova medicina tropical é adotar a saúde das cidades e de suas favelas como campo de atuação prioritário. Além disso, deve incluir as doenças tropicais de causas externas na sua lista de preocupações e considerar a Aids, a tuberculose, a malária e a cólera como suas principais doenças infecciosas. “Também é preciso dar atenção às parasitoses endêmicas tradicionais e às doenças tropicais negligenciadas”, disse. “Para fazer frente a esses desafios, a nova medicina tropical tem ainda de se consolidar como disciplina científica e como campo de atuação multidisciplinar e liderar a mobilização para priorização dos problemas dos trópicos na agenda global.”
Matéria de Evanildo da Silveira para o Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4546, publicada pelo EcoDebate, 25/07/2012